O corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, determinou a intimação de duas magistradas do TJ/GO que negaram a interrupção da gravidez de uma adolescente de 13 anos vítima de estupro.
O corregedor-nacional ressaltou a gravidade e a urgência do caso, que, se comprovado, pode configurar prática de falta funcional com consequências disciplinares.
“É inequívoca a urgência e a gravidade do caso, em tese, razão pela qual determino intimação da juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva, titular do 1º Juizado da Infância e da Juventude de Goiânia, e a desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, do Tribunal de Justiça de Goiás, para que, no prazo de cinco dias, prestem as informações que entenderem pertinentes”, declarou.
Magistradas devem explicar ao CNJ porque negaram aborto legal.(Imagem: Gil Ferreira/Agência CNJ)
A decisão do corregedor foi motivada por uma reportagem publicada pelo site Intercept Brasil.
A matéria jornalística revelou que a adolescente teve seu direito ao aborto legal negado por um hospital em Goiás e por duas decisões judiciais, proferidas pela juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva e pela desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade. A vítima se encontra na 28ª semana de gestação e que busca interromper a gravidez desde a 18ª semana.
O suspeito do estupro é um homem de 24 anos, que seria conhecido de seu pai, com quem ela vive. O caso é investigado pela Polícia Civil.
Parto prematuro
O Ministério Público de Goiás ingressou pedido de alvará de interrupção de gravidez em junho. No final do mês, a juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva concedeu uma medida de emergência em que autorizou a interrupção, mas só se a equipe médica adotasse métodos para preservar a vida do feto – ou seja, que fosse feito um parto prematuro.
“Legalmente não existe prazo legal para interrupção da gestação oriunda de estupro”, reconheceu a juíza. Porém, Silva proibiu procedimentos abortivos como a assistolia – em que o feto é induzido ao óbito dentro do útero para evitar sofrimento -, recomendada pela OMS em interrupções tardias.
“O nascituro encontra-se em avançado estágio temporal de vida intrauterina, com possibilidades de sobrevida”, escreveu a juíza, ressalvando que a menina não precisaria cuidar do bebê, caso sobrevivesse.
Impedimento pelo pai
Após a decisão da juíza, o pai buscou a Justiça para adiar o procedimento, pedindo que se aguardasse até as 28 ou 30 semanas, para que o feto tivesse mais chance de sobreviver. Ele também questionou o estupro, afirmando que estava “pendente de apuração”.
A lei brasileira, no entanto, considera estupro de vulnerável qualquer relação sexual com menores de 14 anos. Vale citar decisão do STJ de maio deste ano em que a 6ª turma destacou que suposto consentimento da vítima não influencia condenação por estupro de vulnerável.
A desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, analisando o caso em segunda instância, aceitou o pedido do pai e proibiu a realização de qualquer procedimento até o julgamento definitivo.
A magistrada alegou não haver laudo médico que comprovasse o risco à vida da menina gestante. Disse, ainda, que a demora na decisão era perigosa, pois ela poderia realizar um aborto enquanto aguardava.
Segundo o Intercept, vários advogados, além de um padre e uma freira da igreja católica, estariam auxiliando o homem. O pedido era para que a menina “segurasse” a gravidez até 30 semanas, quando o feto teria mais chances de sobreviver.
Gravidez infantil
De acordo com a reportagem do Intercept, a própria menina é fruto de gravidez infantil. Sua mãe teria 12 anos quando de seu nascimento.
A menina não frequentava a escola e não fez acompanhamento pré-natal.